Conheci o trabalho do Bruno Gobbato, head de atendimento na Brinquedos Estrela e fundador da Consumer First, consultoria especializada em experiência do cliente, em um evento realizado em fevereiro de 2019 pelo Amigos do CX.
Na ocasião ele explicou a abordagem da Brinquedos Estrela em relação à experiência do cliente e exibiu dois cases bem legais. Um vídeo sobre o Ferrorama e um outro, com fotos, sobre o boneco Falcon, que mostraram o carinho que as pessoas têm pelos produtos da empresa.
Nesta entrevista, realizada por email, Bruno detalha um pouco mais a sua visão sobre CX.
Bruno, fale um pouco sobre a sua trajetória profissional.
Luiz, primeiramente obrigado pela oportunidade, sou fã do seu canal!!! Eu trabalho desde os 14 anos, fui desde office boy e auxiliar de escritório, a vendedor de equipamentos de informática.
Profissionalmente iniciei na área comercial de uma empresa de venda de ingressos pela internet, um dos primeiros e-commerces no Brasil e logo em seguida fui convidado pela Estrela para assumir a área de atendimento.
Enquanto conduzia o SAC da Estrela, outras empresas me chamaram e eu fiz trabalhos de consultoria que me deram um aprendizado gigantesco. Trabalhei para Microsoft, TAM, Probiótica, Mr.Bey, entre outras, cada uma em um segmento diferente e com desafios próprios que resolvemos com sucesso.
O relacionamento dos clientes com as empresas costuma ocorrer de forma transacional, com pouco ou nenhum sentimento positivo envolvido. No caso da Estrela isso parece ser um pouco diferente, já que a empresa fez (e ainda faz) parte da infância de muitos brasileiros e as pessoas têm um carinho muito especial pela marca. Essa carga emocional influencia a forma como você gerencia a experiência do cliente na empresa?
Totalmente Luiz. Eu costumo chamar de “fãs” aqueles clientes que são movidos pela emoção e que além de ter um alto ticket médio e recorrência de compras, não abrem mão de comprar com você, mesmo que o concorrente venda um mesmo produto. Eles costumam ser muito mais tolerantes com a empresa, apesar de exigentes, e via de regra nos ajudam expondo suas opiniões e sugestões de melhorias.
Estes fãs, que em marketing podem ser chamados também de advogados da marca, devem ter condutas específicas para o atendimento. Isso significa que ele terá um atendimento direcionado e não diferente dos demais. Por exemplo, se eu tenho um grupo de fãs de um jogo, certamente eles se comunicam em grupos de redes sociais, assim o que nós determinarmos como uma conduta adequada para um, deve ser estendida para os demais sob pena de você ser questionado. O inverso ocorre também, ou seja, uma conduta que não agrada a um fã pode não agradar a comunidade inteira de fãs, assim temos que encontrar soluções melhores para o problema.
Em resumo, a dica aqui seria estar sempre pronto para ouvi-los, assim seu trabalho fica muito mais fácil e com melhores resultados.
Com muitos anos de experiência na área, você já deve ter utilizado várias métricas de satisfação do cliente. Qual delas apresentou melhores resultados? Por quê?
As métricas devem ser sempre escolhidas para que sejam úteis no processo, não apenas para mostrar a parte boa e ficar bonito na foto para o seu diretor.
Em qualquer métrica sempre me interessam duas coisas: o porquê me avaliou bem e o porquê me avaliou mal. Não basta focar em apenas um dos extremos senão não há aprendizado e desenvolvimento. Toda métrica pode ser útil, desde as que estão disponíveis no Reclame Aqui, como as métricas tradicionais de CSAT e NPS.
Eu gosto muito de uma métrica pouco utilizada que mede o esforço do cliente em resolver uma questão com a empresa, que é a CES (Customer Effort Score), que é um índice muito bom para medir serviços, melhorar a qualidade das relações e é muito precisa para mensurar a lealdade do cliente.
Quais dicas você pode dar ao líder de uma empresa que está tentando criar uma cultura mais centrada no cliente?
A parte mais difícil é sempre modificar a cultura da empresa. Acredito que é muito importante encontrar um propósito para a empresa e seus colaboradores, algo que seja uma força motriz para que todos estejam engajados com a empresa e os clientes.
Por exemplo, o propósito da Disney não é vender ingressos para um parque de diversões, mas sim de fazer seus clientes felizes. Como isso é difundido como uma religião dentro da corporação, qualquer nível hierárquico entende que o seu papel é muito maior do que o seu cargo.
É isso que temos que fazer nas nossas empresas. Entender nosso propósito, difundir isso, demonstrar para as pessoas de todos os níveis e departamentos a sua importância para o cliente e para o sucesso da empresa.
Quando todos tiverem na mesma linha de pensamento, em qualquer mudança ou melhoria nos produtos e serviços da empresa, haverá a preocupação principal em como os clientes serão afetados.
Para criar essa cultura é necessário que a empresa invista tempo e dinheiro. Onde ela deve investir primeiro?
Luiz, eu sou um defensor do quanto mais simples melhor. Complicar não é comigo.
Assim, se você quer começar este processo de customer centric, que comece ouvindo os seus clientes. É preciso entender quem são, como pensam, o que desejam, do que reclamam. E só quando se está seguro de que o conhece, que se deve avançar no processo.
Penso que não adianta muito investir milhões em uma ferramenta de última geração se não se começar pelo básico.
Quais os maiores benefícios você viu uma empresa obter ao ter uma cultura centrada no cliente?
Os benefícios são inúmeros. O primeiro deles é parar de gastar energia no que o cliente não considera importante.
Assim os produtos e serviços ficam mais precisos, a empresa vende melhor e ainda reduz o seu churn pois conhece bem o cliente e se adapta para não o perder para a concorrência.
Essas empresas normalmente possuem uma legião de clientes embaixadores da marca, que eu chamo de fãs da marca. Cito como exemplos a Netflix, Zappos, Harley Davidson, NBA.
Quais são as maiores dificuldades do mercado brasileiro de CX?
Na minha visão ainda há uma resistência de CEOs que são muito céticos aos resultados de uma mudança de estratégia com foco no cliente, mesmo sabendo da relevância disso.
Imagine você que por décadas todas as empresas tinham seus produtos e serviços no centro da estratégia, e o cliente era apenas a ponta. O mercado atual é mais competitivo, com muitos players, tudo pode ser copiado, os preços são muito próximos e tudo vai se comoditizando.
Para uma empresa se diferenciar, o cliente deveria ir para o centro da estratégia. É uma mudança muito grande, mas inevitável e necessária e talvez por isso ainda encontre resistências.
Você coordena equipes de experiência do cliente há vários anos. Quais habilidades um profissional deve desenvolver para trabalhar nessa área?
Nas equipes que gerenciei, o que eu sempre observei é que havia uma resistência muito grande em ouvir o cliente e se colocar no lugar dele. Muitas vezes eu presenciei casos em que o cliente tinha razão, mas havia grande dificuldade do analista enxergar por outro ângulo.
Para quem está começando nesta área o principal é saber ouvir, foco no cliente, empatia e proatividade. E com o tempo novas competências virão e a experiência ajudará no desenvolvimento da carreira.
Quais habilidades você possui atualmente e que gostaria de ter aprendido quando iniciou a carreira?
Hoje eu não tenho mais uma grande preocupação se o cliente tem ou não razão. A gente perde muito tempo com isso e na maioria das vezes o cliente tem razão, porque a maioria das pessoas é honesta.
Consigo enxergar o cliente de uma maneira mais holística e entender que ganharemos e perderemos clientes ao longo do tempo, mas temos que sempre buscar atrair os clientes que nos interessam e fazer de tudo para mantê-los de forma sustentável na base da empresa.
Uma outra dica é fazer o exercício da simplicidade, tentar eliminar barreiras, tornar as coisas mais fáceis tanto para o cliente interno como externo. Temos a tendência de complicar ou de não acreditar que as coisas podem ser muito mais simples.
Quais são as suas fontes de aprendizado na área?
Procuro me atualizar em fontes confiáveis e fazendo benchmark com os meus colegas de profissão, que têm sido muito receptivos nesta troca que é riquíssima.
Leio muita coisa que vem de fora, principalmente de grandes consultorias que trazem muitos dados relevantes. Porém sempre enxergo com ressalvas todo material, por que acredito que não existe o modelo pronto ideal, cada um vai adaptar para sua realidade o que for melhor. Atualmente tenho dado atenção a quase tudo que chega e vou filtrando aos poucos.
Quais inovações em tecnologia irão moldar o futuro da experiência do cliente?
Luiz, esta é a pergunta de um milhão de dólares. Não acredito que tenhamos hoje uma tecnologia suficientemente boa para podermos dizer que irá moldar o futuro da experiência do cliente.
No entanto acredito que várias tecnologias integradas (e de nicho) poderão fazer a diferença no futuro, mas desde que sejam consideradas completamente relevantes para o cliente.
Vejo atualmente muita empresa que investiu pesado em bots, mas que estão tendo péssima avaliação, justamente por que não consideraram uma série de fatores que impactariam na experiência do cliente.
Para finalizarmos, qual setor está defasado em relação à experiência do cliente e que você gostaria de atuar?
Em todos os setores existem empresas que entenderam a importância de se ter uma estratégia voltada para o cliente e levam a sério isso. Existe uma grande maioria que ainda estuda o tema ou nem começou.
Eu não tenho um setor de preferência. Eu gostaria de atuar naquela empresa que acredita no seu trabalho e te dá carta branca. Para essas eu sempre consegui entregar um resultado superior.
Super bacana a entrevista, adorei!!!
Olá José Roberto. Tudo bem?
Que legal que você gostou.
Muito obrigado.