Nesses tempos de pandemia e diversas restrições pelas quais estamos passando, a conveniência tem sido um fator importante para manter o equilíbrio do relacionamento entre clientes e empresas.
Em 2020 diversas companhias tiveram que se adaptar à força ao novo cenário e aceleraram a transformação digital, já que os clientes passaram a exigir melhores experiências.
No meu dia a dia pude ver o quanto a mentalidade dos líderes mudou rapidamente e como eles passaram a pensar mais na experiência do cliente. A satisfação do cliente agora é regra do jogo e não algo secundário como muitos pensavam até 2019.
O papel da conveniência
Shep Hyken é um dos principais nomes da área de CX e publicou diversos livros de customer service e experiência do cliente.
Um dos seus livros mais interessantes é o The Convenience Revolution. Lançado em 2018, ele detalha como diversas empresas estão usando a conveniência para entregar melhores experiências aos seus clientes.
De acordo com os dicionários, conveniência significa algo que atende ao gosto, às necessidades, ao bem-estar de um indivíduo e que também é útil, simplifica uma rotina e economiza o tempo.
E é justamente isso que acontece quando as empresas aplicam seis princípios que são o tema central do livro.
Redução de atrito
O primeiro princípio, redução do atrito, é provavelmente o mais importante, pois é justamente o atrito que dificulta uma boa experiência do cliente.
Atritos são aqueles momentos onde você passa raiva com uma empresa, como uma entrega que não é feita na data combinada, quando você tem que esperar no consultório médico mesmo tendo chegado na horário, quando está em uma ligação no suporte técnico e é transferido para outra área e tem que contar todo o problema novamente…
O atrito é o inimigo da experiência do cliente. Isso frustra o consumidor, irrita sua equipe e interrompe o crescimento da empresa. Se o atrito permanecer na jornada de compra, isso pode interromper as vendas futuras.
Shayla Price
Shep Hyken sugere que você deve tornar a interação com o cliente o mais fácil possível, ao remover barreiras entre o consumidor e o serviço e que a redução do atrito é mais importante do que baixar o preço ou redesenhar o produto ou serviço.
Um ponto interessante que Shep Hyken comenta é a capacidade que a conveniência tem de causar disrupção em diversos setores da economia. Como exemplo ele cita o Uber, que ao proporcionar conveniência para seus usuários transformou a forma como nos transportamos, a Ace Hardware, uma pequena rede de lojas de construção que facilita a interação com o cliente desde o estacionamento, no processo de compra dentro da loja, no atendimento e no pagamento rápido e o Google por toda conveniência que os seus produtos nos fornecem no dia a dia.
Uma das ideias centrais deste livro é a noção de que o atrito mata a experiência do cliente e aqueles que fazem o melhor trabalho para reduzi-lo ou removê-lo têm maior probabilidade de vencer no mercado.
Shep Hyken
No final de cada um dos seis princípios, Shep Hyken deixa algumas perguntas para refletirmos:
- Quais atritos os seus clientes experimentam atualmente?
- O que você pode mudar em seus processos internos ou externos para tornar a experiência de seus clientes mais fácil e com menos complicações?
- Mesmo que muitos clientes estejam dispostos a pagar um pouco mais por conveniência, existe uma maneira de tornar a experiência deles mais fácil e mais descomplicada e mesmo assim acabar cobrando menos do que a concorrência?
Self-service
O tema central desse princípio é a empresa deixar que o cliente controle as transações.
Entre esperar na fila ou ficar aguardando atendimento pelo telefone, geralmente as pessoas preferem conduzir as próprias ações e sistemas de autoatendimento/self-service bem desenhados auxiliam nisto.
O livro cita diversos exemplos de empresas que conseguem fornecer self-service. A Ikea fornece uma experiência onde o cliente vaga pela loja, escolhe o seu produto, paga, ele mesmo leva para casa e monta o seu móvel (se quiser, o cliente pode pagar para que a entrega e montagem sejam feitas por profissionais).
No caso da Salesforce, a empresa desenvolve o seu sistema para ser robusto e intuitivo e além disso disponibiliza ajuda em FAQs e em vídeos no Youtube, tudo para que os próprios clientes encontrem as respostas para suas dúvidas.
Shep Hyken faz uma observação muito importante de que quando possível, as opções de autoatendimento devem fornecer um backup humano, ou seja, quando a tecnologia falhar, um colaborador deve estar presente para ajudar o cliente. Isso acontece muito com chatbots, que quando não conseguem atender as pessoas, transferem a conversa para um atendente humano.
Uma opção de autoatendimento pode melhorar a experiência do cliente com sua empresa, mas nem todas as opções de autoatendimento o fazem.
Shep Hyken
Além disso, ele explica que as pessoas são diferentes. Enquanto algumas usam mensagens de texto para comprar, outros preferem um site e que é importante que todas as opções sejam bem testadas antes de serem disponibilizadas para o público.
E por fim ele deixa claro que o desenvolvimento do autoatendimento nunca acaba e que deve ser um compromisso contínuo da empresa, pois tanto a tecnologia quanto a expectativa do cliente estão evoluindo.
As perguntas finais deste princípio são:
- Em que estágio é necessário que sua empresa interaja com os clientes? Que parte de sua interação poderia ser otimizada por meio de uma opção de autoatendimento que permita aos clientes controlá-la da forma como eles querem?
- É possível que os clientes que preferem o autoatendimento passem pelo processo de compra sem precisar interagir diretamente com um colaborador?
- Que tipo de plano de backup amigável ao cliente você pode incluir em sua opção de autoatendimento? Se um cliente tiver problemas ao usar seu sistema de autoatendimento, quão fácil será para ele se conectar com um ser humano?
Tecnologia
A tecnologia é uma aliada na redução do atrito. Esse princípio recomenda que novos processos, ferramentas e formas de interação devem ser criados para facilitar a vida do cliente, mas que é necessário prestar atenção, pois às vezes a própria tecnologia pode causar atritos.
Nesta parte do livro eu vejo um foco maior em melhorar a experiência do cliente (CX) através da experiência do usuário (UX). Escrevi sobre a diferença entre as duas neste artigo.
O Paypal e a simplicidade que ele trouxe no processo de pagamento, o Domino’s Pizza e a facilidade em pedir e receber pizzas e a rede de farmácia Walgreens que usa um app para interagir com os seus clientes são alguns dos exemplos onde a conveniência acontece por meio da tecnologia.
Os clientes apreciam um processo sistemático que torna a vida mais fácil. Se sua tecnologia fizer isso, eles retornarão para você continuamente.
Shep Hyken
Perguntas finais do capítulo:
- É fácil para novos clientes dominarem a tecnologia e as plataformas de informação que você compartilha com eles? Quanto tempo leva esse processo?
- Existe alguma ferramenta tecnológica que você viu outras organizações usarem (mesmo que não sejam seus concorrentes) e que possa ser útil para sua empresa? Se você pudesse inventar qualquer tecnologia para melhorar a experiência do cliente, qual seria? Existe uma opção semelhante que se encaixe no seu orçamento?
- O que seus clientes têm a dizer sobre a facilidade (ou dificuldade) de utilizar a tecnologia que a sua empresa oferece para comunicação e serviços?
Assinatura
Os modelos de negócios baseados em assinaturas não param de crescer. Eu sou super fã deste tipo de serviço, que permite a automação e entrega programada de produtos e serviços que os clientes usam regularmente (um livro que li recentemente, o Subscribed, detalha muito bem esse modelo).
Nos casos de venda fechada, a empresa vende o produto para o cliente e muitas vezes o relacionamento acaba nesse momento. Já na assinatura a empresa precisa criar boas experiências e entregar valor constante para manter o cliente para não perdê-los, pois nesse modelo as suas métricas de resultados levam em consideração a receita futura que será gerada por esses clientes.
Shep Hyken explica que clientes que assinam serviços e percebem valor neles se acostumam com a conveniência e que eles veem o processo de mudar de fornecedor como algo que gera atrito e por isso eles tendem a manter a assinatura.
Um modelo de assinatura coloca as preferências de compra do cliente no piloto automático.
Shep Hyken
Alguns exemplos do livro são bem conhecidos por nós, como Netflix e Spotify. Outros como o Dollar Shave Club que envia aparelhos de barbear e Blue Apron que entrega ingredientes frescos para preparação de comida não são tão conhecidos por aqui, mas são bons cases desse princípio.
E novamente as perguntas para refletir:
- Considere como a Netflix superou a Blockbuster, concentrando-se no que acreditava ser inconveniente para a experiência do cliente da Blockbuster, como multas por atraso na entrega dos filmes. A sua organização tem algum ponto fraco semelhante que poderia ser usado pela concorrência para roubar negócios de você? Se sim, quais são eles?
- Qual é a reclamação mais comum que você ouve dos clientes? Isso poderia ser minimizado ou totalmente removido por meio de um modelo de assinatura bem projetado? Se você já tem um modelo de assinatura em vigor, quem é seu concorrente nessa área e o que eles estão fazendo que pode ser mais conveniente para seus clientes?
- Existe algum produto ou serviço que seus clientes compram regularmente? Você pode oferecer descontos em qualquer produto ou serviço para vender para eles de forma recorrente?
Entrega
Esse é um princípio que teve se tornou essencial em 2020 devido à pandemia.
Como humanos, geralmente escolhemos as opções que evitam esforço e levar o produto até o consumidor ao invés de fazê-lo buscar, de forma rápida e confiável, é um grande benefício do ponto de vista da experiência (e de saúde em 2020).
Esse capítulo mostra três vantagens para o cliente:
Economia de tempo: você não precisa pegar o carro ou outro meio de transporte, ir até várias lojas e ficar nas filas.
Controle sobre a compra: você pode deixar para fazer as compras no momento que quiser, como as compras de Natal que podem ser feitas mais perto do dia 25. Você pode até pagar mais para a entrega rápida, mas a conveniência pode valer a pena.
Economia de atenção: você faz a compra e a entrega é um item a menos para você se preocupar.
Alguns dos exemplos desse princípio citados no livro são a Insomnia Cookies, que entrega biscoitos em até as 3 da manhã e a floricultura online 1-800-Flowers.com.
Os clientes gostam quando os produtos vêm até eles, por que eles não precisam ir a lugar nenhum.
Shep Hyken
Esse princípio vai evoluir muito nos próximos anos, já que o mercado está se movimentando para fazer entregas mais rápidas, como novos centros de distribuição do Mercado Livre e Amazon e também o uso de tecnologias como drones.
Perguntas:
- Quanto tempo seus clientes esperam (dirigindo ou em filas) por algo que eles compram da sua empresa? Quanto tempo eles poderiam economizar se você oferecesse uma opção de entrega?
- Se você já oferece uma opção de entrega, como seus clientes se sentem a respeito? Existe algum feedback útil sobre como poderia ser melhorada? Existem reclamações consistentes de clientes sobre sua opção de entrega?
- Em caso afirmativo, o que pode ser feito para resolver isso? Que opções de entrega sua concorrência oferece? Se você fornece serviços e não produtos físicos, como pode levar seu serviço aos clientes?
Acesso
O último princípio detalha a necessidade de a empresa estar disponível quando o cliente precisar e é composto de três áreas:
Disponibilidade: estar pronto para atender o cliente nos momentos que fazem sentido para ele.
Comunicação: passar informações claras e precisas para não confundir o cliente.
Localização: manter um espaço físico para atender o cliente ou ter uma presença na internet que permita uma experiência online similar ou melhor do que a do local físico.
Os exemplos mencionados nesse princípio são a Enterprise Rent a Car, que disponibiliza carros reserva em diversas localidades, o Walmart por estar acessível a 90% da população americana em uma distância de até 25km e o Starbucks que está em todo lugar.
Quando damos aos clientes menos do que eles esperam em termos de disponibilidade, comunicação e localização, estamos adicionando atrito ao seu dia a dia e abrindo uma porta para a nossa concorrência.
Shep Hyken
Perguntas
- Você está disponível para seus clientes? Especificamente, os colaboradores estão disponíveis para conversar quando necessário? A sua comunicação é simples, direta, respeitosa e leva o cliente em direção ao que ele deseja?
- A sua localização é fácil de chegar? O que você faz de diferente da concorrência em termos de disponibilidade, localização e acesso? Como você oferece horários flexíveis ou acesso alternativo fora do horário?
Um ponto importante
No último capítulo, Shep Hyken faz uma observação relevante:
Por favor não trate os exemplos que ofereci no livro como uma espécie de checklist. Não presuma que faz sentido tentar implementar cada uma das ideias que compartilhei com você. Mas, por favor, use este livro para iniciar o brainstorming.
Neste caso, o contexto da empresa deve ser levado em consideração, já que nem todos os seis princípios se aplicam a todas as empresas.
Além disso, ele deixa claro que a conveniência deve ser percebida pelo cliente. Ele cita como exemplo um hotel que paga caro para instalar diversos equipamentos para os clientes, mas os clientes não os usam e não veem valor nisso.
Outra dica que ele detalha é a disposição de testar diversas ideias. Na busca de desenvolver melhores experiências para os clientes algumas ideias darão certo e outras não e que estas falhas devem gerar aprendizados.
Conclusão
The Convenience Revolution é um daqueles livros com conceitos bem explicados e de fácil entendimento.
Eu gostei muito de aprender sobre os seis princípios. Embora seja desafiador aplicá-los na prática, a partir de agora, quando eu for desenvolver iniciativas de melhorias de CX, eu sempre levarei esse aprendizado para as discussões.
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